A corrida global por tecnologias limpas e digitalização ampliou a demanda por ímãs permanentes de alto desempenho, fundamentais para veículos elétricos, turbinas eólicas, eletrônica e defesa. Nesse tabuleiro, os Elementos de Terras Raras (ETRs) voltaram ao centro das estratégias industriais: países buscam reduzir dependências externas e garantir, dentro de suas fronteiras ou de parceiros confiáveis, o domínio do ciclo produtivo — da mina ao ímã.
Nesse processo, o gargalo continua sendo a etapa intermediária de separação e refino, onde o concentrado se transforma em produtos com especificação comercial; é também aí que se decide preço, previsibilidade de entrega e acesso a financiamento.
Para o Brasil, que reúne reservas relevantes e massa crítica científica, a questão-chave deixou de ser apenas “onde estão os recursos”, e passou a ser viabilidade: “como converter esse potencial em contratos, indústria e empregos qualificados”.
O que são Terras Raras (ETRs)
Os Elementos de Terras Raras (ETRs) são 17 elementos químicos da tabela periódica (lantânio ao lutécio, mais escândio e ítrio) usados em aplicações estratégicas como ímãs permanentes, catalisadores, ligas especiais, polimento óptico e componentes eletrônicos.
Apesar do nome, não são “raros” na crosta terrestre; o desafio está em encontrá-los em concentrações economicamente viáveis, separá-los e refiná-los com qualidade consistente para contratos industriais.
Terras Raras Leves
Conhecidas como “leves” por ocuparem o início da série dos lantanídeos, incluem, entre outros: lantânio (La), cério (Ce), praseodímio (Pr), neodímio (Nd), promécio (Pm) e samário (Sm).
Costumam ocorrer em maior abundância relativa e, em muitos depósitos, sustentam o volume do projeto. Porém, a captura de valor depende de transformar o concentrado em óxidos separados com especificação comercial — especialmente para Nd/Pr usados em ímãs.
- Uso típico: ímãs permanentes de alto desempenho (Nd, Pr), catalisadores automotivos e de refino (La, Ce), polimento de vidros e lentes (Ce).
Terras Raras Pesadas
A “fração pesada” está mais ao fim da série e inclui: gadolínio (Gd), térbio (Tb), disprósio (Dy), hólmio (Ho), érbio (Er), túlio (Tm), itérbio (Yb), lutécio (Lu), além do ítrio (Y), que se comporta de modo semelhante e costuma ser classificado junto às pesadas.
São, em geral, menos abundantes e mais caros, mas críticos para especificações de alto valor. A disponibilidade de Tb e Dy, por exemplo, é fator sensível em contratos de ímãs para veículos elétricos e eólica; por isso, políticas e projetos que assegurem separação/refino desses elementos tendem a atrair compradores e financiamento.
- Uso típico: aditivos para elevar o desempenho térmico e a estabilidade magnética dos ímãs (Dy, Tb), aplicações médico-industriais (Gd), lasers e fibras ópticas (Er, Yb).
Distribuição global e brasileira de reservas de Terras Raras
A distribuição global das reservas de Elementos de Terras Raras (ETRs) continua concentrada em poucos países — com destaque absoluto para a China — enquanto, no Brasil, as ocorrências se espalham por polos alcalino-carbonatíticos (MG/GO/SP), graníticos (AM) e argilas iônicas (GO).
Em números, os totais nacionais vêm do U.S. Geological Survey (USGS); para o Brasil, o Serviço Geológico do Brasil (SGB) e a Agência Nacional de Mineração (ANM) ajudam a localizar os principais distritos e, em alguns casos, a quantificar recursos locais.
Terras Raras no mundo — Reservas (USGS, 2025)
- China: 44 milhões t (REO equivalente).
- Brasil: 21 milhões t.
- Austrália: 5,7 milhões t (nota do USGS: reservas JORC ou equivalentes de 3,3 milhões t.)
- Índia: 6,9 milhões t.
- Rússia: 3,8 milhões t.
- Vietnã: 3,5 milhões t.
- Estados Unidos: 1,9 milhão t.
Terras Raras no Brasil — Onde estão e capacidades conhecidas
- Total Brasil (reserva/recurso nacional): ~21 milhões t (REO).
- Araxá (MG): complexo alcalino-carbonatítico com monazita (predominam ETR leves como La, Ce, Nd, Pr). Única reserva oficialmente reconhecida pelo SGB no país.
- Poços de Caldas (MG): polo com diversas empresas em pesquisa; recurso indicado pela ANM/SGB de ~950 milhões t de rocha a 0,25% TREO (indicativo de potencial para Nd/Pr em matriz monazítica).
- Tapira (MG): ocorrências associadas a rochas alcalinas (fosfato/níobio) com indícios de ETR leves (Nd/Pr).
- Catalão (GO): complexo alcalino-carbonatítico com monazita/bastnaesita (tendência a ETR leves).
- Minaçu / Serra Verde (GO): argilas iônicas com mistura de ETR leves (Nd/Pr) e fração crítica de ETR pesadas (Dy/Tb) nos concentrados.
- Jacupiranga e Itapirapuã (SP): complexos alcalinos com monazita/bastnaesita (ETR leves).
- Pitinga (AM): ambiente granítico com xenotima (associada a ETR pesadas como Y, Dy, Er).
- Bom Futuro (RO): placeres continentais com monazita (ETR leves).
- São Francisco do Itabapoana – RJ / São Gonçalo do Sapucaí – MG: paleoplaceres com associação monazita/ilmenita (ETR leves).
Gargalos na obtenção de Terras Raras
No mundo: a etapa intermediária (separação e refino)
O principal gargalo global está no “meio” da cadeia: transformar o concentrado mineral em produtos com especificação comercial (óxidos separados e compostos de alta pureza).
É nessa etapa de separação e refino que se decide qualidade, regularidade de entrega e preço — e onde a capacidade produtiva está concentrada em poucos países.
Desafios:
- Escala e complexidade química: os elementos aparecem juntos e com comportamento muito parecido; separar cada um com pureza consistente exige processos longos, controle fino e investimento elevado.
- Concentração geográfica: poucas plantas dominam a etapa, o que cria dependência de um número restrito de fornecedores.
- Custos e insumos críticos: alto consumo de energia, água e reagentes pressionam custos operacionais (OPEX) e dificultam novos entrantes.
- Exigências de mercado: setores como automotivo e eólico pedem rastreabilidade, regularidade e padrões de pureza rígidos; sem isso, não há contratos de longo prazo.
No Brasil: além do refino, previsibilidade regulatória e financiamento
No Brasil, o gargalo também é a separação e o refino, mas há fatores adicionais que alongam prazos e encarecem projetos.
O que mais pesa:
- Capacidade limitada de separação/refino doméstica: poucos ativos prontos para processar em escala, o que mantém a dependência de terceiros e reduz a captura de valor.
- Licenciamento ambiental descolado do projeto real: quando o Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) não contempla com precisão efluentes e resíduos da etapa de refino, surgem exigências tardias, retrabalho e atrasos.
- Financiamento de plantas químicas: é intensivo em investimentos (CAPEX) e requer provas prévias (pilotos, lotes semi-industriais, cartas de intenção de compra) para viabilizar crédito com custo competitivo.
- Logística e insumos: disponibilidade e custo de energia, água e reagentes afetam diretamente a viabilidade; regiões com infraestrutura consolidada avançam mais rápido.
- Integração comercial: sem acordos de fornecimento com especificações claras (qualidade, volumes, prazos), projetos ficam expostos à volatilidade de preço do concentrado.
Cadeia de suprimento doméstica: onde estamos avançando
O Brasil começa a fechar lacunas entre laboratórios e indústrias. Iniciativas tecnológicas e industriais — como laboratório-fábrica e linhas piloto/semi-industriais dedicadas a ligas e ímãs de terras raras — vêm reduzindo o risco tecnológico, formando equipes e aproximando empresas do “ciclo do ímã” (da matéria-prima ao componente industrial).
Esse tipo de infraestrutura encurta o caminho para contratos e para o comissionamento de plantas em escala, função essencial para transformar projetos em produção recorrente.
Como transformar potencial em valor concreto
O panorama mostra que a geografia das reservas concentra volume em poucos países e que o Brasil figura entre os destaques em recursos, mas ainda captura pouco valor.
O ponto de virada está na etapa intermediária de separação e refino: é ali que o concentrado se transforma em produto com especificação comercial, viabiliza contratos mais previsíveis e melhora a atratividade para financiamento.
Ao mesmo tempo, a organização regulatória e o planejamento de custos precisam refletir o processo real, enquanto a capacidade tecnológica — laboratórios, linhas piloto e operação semi-industrial — encurta a distância entre projeto e produção recorrente.
Em síntese, o caminho para transformar potencial em indústria e empregos qualificados passa por combinar reservas, previsibilidade regulatória e a consolidação do “meio” da cadeia.
Se você busca elevar a segurança, a eficiência e a conformidade do seu projeto de Terras Raras, conte com apoio especializado; conheça as soluções da BVP Geotecnia e Hidrotecnia e saiba como podemos ajudar.
Se fizer sentido para o seu momento, entre em contato.
FAQ — Terras Raras (ETRs)
1) O que são Terras Raras (ETRs)?
É um grupo de 17 elementos químicos: os 15 lantanídeos (do lantânio ao lutécio) mais ítrio e escândio. Apesar do nome, não são “raros” na crosta; o desafio é encontrá-los em teores viáveis e separá-los/refiná-los com qualidade consistente.
2) Quais são os principais elementos e como se agrupam?
Costuma-se dividir em leves (ex.: lantânio, cério, praseodímio, neodímio, samário) e pesadas (ex.: gadolínio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio, lutécio; o ítrio se comporta como pesada). Para ímãs permanentes, destacam-se neodímio (Nd) e praseodímio (Pr); para elevar estabilidade térmica/magnética, disprósio (Dy) e térbio (Tb).
3) Para que servem as Terras Raras?
Aplicações-chave: ímãs permanentes (veículos elétricos, turbinas eólicas, eletrônica), catalisadores (refino e automotivo), polimento óptico, ligas especiais, fibras/lasers e usos médico-industriais (contraste, equipamentos).
4) Onde estão as maiores reservas no mundo?
A maior parte está em poucos países, com China em primeiro lugar, seguida por Brasil, Austrália, Índia, Rússia e Vietnã.
5) Onde estão as principais ocorrências no Brasil?
Polos em Minas Gerais (Araxá, Poços de Caldas, Tapira), Goiás (Catalão, Minaçu/Serra Verde), São Paulo (Jacupiranga, Itapirapuã), Amazonas (Pitinga), Rondônia (Bom Futuro) e ocorrências em RJ/MG (paleoplaceres).
6) Qual é o principal gargalo no mundo?
A separação e o refino: transformar concentrado em produtos com especificação comercial (óxidos/compostos de alta pureza) com regularidade e rastreabilidade.
7) E no Brasil, o que mais trava?
Além do refino, pesam licenciamento aderente ao processo real, financiamento (intensivo em CAPEX, despesas de capital) e custos operacionais (energia, água, reagentes — OPEX, despesas operacionais), além da integração comercial com compradores.
8) Por que separação/refino muda a economia do projeto?
Porque é nessa etapa que se define qualidade e previsibilidade, viabilizando contratos de longo prazo e melhorando a bancabilidade (acesso a financiamento em condições mais competitivas).
9) Como está a cadeia brasileira hoje?
Avança na ponte laboratório–indústria (linhas piloto/semi-industriais e laboratório-fábrica para ligas/ímãs), reduz risco tecnológico e aproxima empresas de contratos e comissionamento de plantas em escala.
10) O que observar ao comparar números de reservas?
Confirme ano e fonte, se o valor está em REO, a metodologia (reserva x recurso, JORC etc.) e evite comparar números que não usem o mesmo padrão.
11) Quais caminhos existem para viabilizar o refino?
(a) Planta própria (mais controle, mais investimento), (b) parceria industrial (risco/capital compartilhados) e (c) “pedágio” em planta de terceiros (menor investimento inicial, porém margens menores e maior dependência).



0 comentários