A barragem de rejeitos é uma estrutura essencial para a mineração. Sem esse tipo de solução, atividades como concentração, flotação e disposição de finos seriam inviáveis em larga escala.
À luz de episódios recentes da história do Brasil — marcada por tragédias como Mariana (2015) e Brumadinho (2019) —, as atividades mineradoras passaram a demandar mais rigor regulatório, além de ações para reforçar a cultura de gestão de riscos, garantir a confiabilidade de projetos e operar com padrões de classe mundial.
E tudo começa com o básico: a compreensão sobre os tipos de barragem e o arcabouço legal que rege sua segurança.
Tipos de barragens de mineração
As barragens de mineração podem ser classificadas pela finalidade, pelo método construtivo e pelos materiais empregados. Entender as diferenças ajuda a definir critérios de projeto, operação, monitoramento e descaracterização.
Classificação quanto à finalidade:
- Barragem de rejeitos: destinada ao armazenamento de polpas e lamas com alta fração de finos, frequentemente dispostas em etapas (alteamentos) ao longo da vida útil. É o tipo mais sensível do ponto de vista geotécnico e regulatório, pois combina grandes volumes com materiais parcialmente saturados e variabilidade geológica e operacional;
- Barragem de água: usada para reserva hídrica de processo, recirculação e controle de balanço hídrico da mina e da planta. Embora não armazene rejeitos, ainda pode apresentar Dano Potencial Associado (DPA) elevado, conforme a ocupação e os ecossistemas a jusante;
- Barragem de sedimentação: projetada para reter sedimentos arrastados por águas pluviais, reduzindo assoreamento e melhorando a qualidade da água lançada. Normalmente tem volumes menores, mas deve cumprir requisitos de estabilidade e operação segura;
Classificação quanto ao método de alteamento (especialmente relevante para barragem de rejeitos):
- Método a montante: utiliza o próprio rejeito como base para etapas sucessivas de alteamento. É mais econômico, mas mais vulnerável à liquefação e a eventos de instabilidade. No Brasil, seu uso foi proibido, e as estruturas existentes foram submetidas a cronogramas de descaracterização de barragens definidos pela regulação setorial;
- Método à jusante: cada etapa é construída sobre fundações mais estáveis, avançando para jusante. Oferece maior segurança estrutural, com melhor desempenho sob solicitações sísmicas e hidrológicas, porém com custo e footprint mais elevados;
- Método linha de centro (ou centro): combina aspectos de montante e jusante, com a crista mantendo-se, em geral, alinhada ao eixo original. Tem comportamento intermediário e requer controle rigoroso de drenagem e densificação dos materiais.
Classificação quanto aos materiais de construção:
- Terra e enrocamento: taludes construídos com solo compactado e/ou rocha. Demandam projeto de drenagem interna (drenos horizontais, filtros, chaminés drenantes) para controle de pressões neutras e percolação;
- Concreto e CCR: menos comuns em rejeitos, mas empregados em barragens de água e estruturas especiais, com desempenho superior no controle de vazões e no dimensionamento hidrológico.
Independentemente do tipo, a segurança de uma barragem de rejeitos depende da integração entre projeto, construção, operação, monitoramento e planos de emergência.
A instrumentação ― piezômetros, inclinômetros, medidores de vazão, radares de talude, entre outros ―, combinada com inspeções de campo e análise de dados, é o núcleo de um programa de gestão que antecipa anomalias e reduz incertezas.
Principais legislações
O Brasil consolidou um arcabouço legal robusto para a segurança de barragens. A seguir, você confere um panorama das normas centrais que impactam a operação, o monitoramento e a descaracterização de barragens de rejeitos:
Lei nº 12.334 – Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB)
A PNSB apresenta princípios, responsabilidades e instrumentos de segurança que valem para todo o ciclo de vida de uma barragem. Entre os pilares estão:
- Plano de Segurança da Barragem (PSB);
- classificação por Categoria de Risco (CRI) e Dano Potencial Associado (DPA);
- realização de inspeções regulares;
- revisões periódicas de segurança;
- transparência das informações para autoridades e sociedade.
Barragens sujeitas à PNSB
Entre os tipos de estrutura sujeitas à PNSB estão as barragens de rejeitos de mineração, barragens de água para usos múltiplos e diversas estruturas industriais.
Essa sujeição à PNSB implica que os responsáveis pela barragem precisam cumprir obrigações como elaborar e manter atualizado o PSB, classificar a barragem (CRI e DPA), realizar inspeções e revisões com periodicidade adequada ao risco, manter registros operacionais, treinar equipes e articular com a defesa civil local.
Para estruturas de mineração, além da PNSB, valem exigências adicionais definidas pelo órgão regulador do setor.
Resolução ANM nº 95, de 07 de fevereiro de 2022
A Resolução ANM nº 95/2022 consolidou dispositivos que tratam de procedimentos e requisitos para segurança de barragens no setor mineral, incorporando lições aprendidas após os grandes desastres. Entre os pontos de destaque estão:
- Regras para estabilidade e descaracterização de barragens construídas pelo método a montante, com cronogramas e condicionantes técnicos;
- Reforço aos requisitos de gestão de risco, incluindo monitoramento, auditorias e evidências de estabilidade;
- Exigências relacionadas a prontidão e resposta a emergências, comunicação, rotas de fuga e organização do PAEBM quando aplicável ao contexto da estrutura e do território a jusante;
- Diretrizes que fortalecem a governança, a rastreabilidade de dados e a transparência perante a ANM e demais autoridades.
Para empreendedores, a mensagem é clara: a operação de uma barragem de rejeitos exige comprovar, de forma contínua, que as condições de estabilidade e segurança estão atendidas — da instrumentação aos procedimentos de campo, passando por critérios de alteamento, controle de percolação, regimes de chuvas e auditorias independentes.
Resolução CNRH nº 241, de 10 de setembro de 2024
Por sua vez, a resolução CNRH nº 241/2024 traz definições e orientações para que empreendedores e entidades fiscalizadoras utilizem parâmetros coerentes ao classificar e gerenciar seus ativos; o que facilita a comparabilidade entre setores e a articulação com a PNSB.
A resolução enfatiza que a classificação deve refletir não apenas características físicas (altura, volume armazenado), como elementos de contexto, como ocupação humana a jusante, infraestrutura crítica, sensibilidade ambiental e qualidade da gestão.
Essa visão integrada fortalece a priorização de ações: barragens com DPA alto e CRI elevado demandam inspeções mais frequentes, níveis maiores de instrumentação, planos de emergência mais detalhados e comunicação ativa com defesas civis e comunidades potencialmente afetadas.
Classificação das barragens
A classificação é o coração da gestão de segurança, uma vez que define o nível de rigor necessário para cada estrutura e direciona recursos para onde o risco é maior.
Na mineração, usar corretamente CRI, DPA e volume é fundamental para orientar inspeções, revisões periódicas, auditorias independentes, monitoramento e ações de melhoria.
Categoria de Risco (CRI)
A CRI reflete a probabilidade de ocorrência de problemas a partir das características técnicas do projeto, da construção, da operação e da manutenção. Assim, considera aspectos como:
- qualidade e atualização do projeto executivo e do as built;
- condições geológicas e geotécnicas;
- método de alteamento;
- desempenho da drenagem;
- estado de conservação, existência e confiabilidade da instrumentação;
- qualificação da equipe;
- gestão de mudanças;
- aderência a procedimentos operacionais.
Para apresentar um CRI menor, uma barragem de rejeitos precisa de um projeto bem fundamentado, instrumentação consistente, inspeções em rotina e resposta rápida a anomalias.
Por outro lado, inconsistências de dados, histórico de anomalias não tratadas, documentação desatualizada e mudanças operacionais sem análise de risco elevam a CRI e exigem medidas corretivas.
Dano Potencial Associado (DPA)
O DPA expressa a gravidade das consequências caso ocorra uma ruptura ou falha funcional significativa.
Em sua avaliação, são considerados fatores como população a jusante, presença de áreas urbanas, infraestrutura crítica (rodovias, pontes, linhas de transmissão), bens econômicos, patrimônio cultural e sensibilidade ambiental (unidades de conservação, cursos d’água, áreas de recarga, fauna e flora).
Em geral, classifica-se o DPA em categorias como alto, médio ou baixo, de forma a orientar:
- nível de detalhamento de estudos;
- alcance do Plano de Ação de Emergência;
- intensidade do monitoramento.
Para a barragem de rejeitos, o DPA costuma ser alto quando há comunidades próximas, vias estratégicas ou ecossistemas frágeis na mancha de inundação projetada. Um contexto que demanda modelagem hidráulica e geotécnica robusta, definição clara de zonas de autossalvamento, rotas de fuga, sistemas de alerta e coordenação com defesas civis.
Volume
O volume armazenado é uma referência que impacta diretamente o potencial de dano e a complexidade de gestão — grandes volumes exigem reservatórios bem dimensionados, vertedores confiáveis, bacias de dissipação e um balanço hídrico capaz de lidar com eventos extremos de chuva, evaporação e aporte de polpa.
Na mineração, o volume de uma barragem de rejeitos evolui ao longo do tempo, à medida que a produção avança e os alteamentos são executados. Por isso, revisitar periodicamente as premissas do projeto, atualizar curvas cota-volume e validar a capacidade hidráulica é parte do ciclo de segurança.
Quem é responsável pela fiscalização de barragens de mineração?
No Brasil, a PNSB define que a entidade fiscalizadora é o órgão setorial competente de acordo com o uso da barragem.
No caso de barragem de rejeitos e outras barragens ligadas à atividade minerária, a fiscalização é exercida pela Agência Nacional de Mineração (ANM), que estabelece normas, recebe informações técnicas e realiza ações de inspeção e auditoria.
Outras entidades atuam conforme a finalidade da barragem:
- Para usos de geração de energia: Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) exerce a fiscalização setorial;
- Para acumulação de água outorgada em âmbito federal: Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) tem atribuições fiscalizatórias. Nos âmbitos estaduais, órgãos gestores de recursos hídricos cumprem papel análogo;
- Em processos de licenciamento ambiental federal: IBAMA pode impor e acompanhar condicionantes; em licenciamento estadual, as secretarias de meio ambiente assumem atribuições correlatas;
- Defesas civis municipais e estaduais são parceiras na preparação e resposta a emergências, especialmente em barragens com DPA alto, integrando-se a exercícios simulados, treinamentos e comunicação de riscos.
É importante ressaltar também que a responsabilidade primária pela segurança é sempre do empreendedor. Cabe à empresa manter a barragem de rejeitos estável e segura, enquanto a entidade fiscalizadora supervisiona, cobra evidências, valida conformidades e, quando necessário, aplica sanções.
Barragem segura é com apoio especializado!
A barragem de rejeitos é um ativo crítico para a mineração e, ao mesmo tempo, um ponto sensível de exposição socioambiental e reputacional.
Para gestores e profissionais, a prioridade é transformar requisitos legais em rotinas consistentes. Isso começa por um diagnóstico realista da CRI, DPA e volume; segue com um Plano de Segurança da Barragem vivo, com metas e responsáveis claros; e se consolida com monitoramento em tempo real, revisão periódica por especialistas independentes e integração com defesa civil e comunidades.
Se você busca aprimorar a gestão da sua barragem de rejeitos, busque com apoio especializado; conheça os serviços da BVP Geotecnia e Hidrotecnia e saiba como podemos ajudar!
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